Ei-lo:
Na serra o plano é simples. Como diria um companheiro amante de serranias e de pedaladas que esporadicamente encontro, "primeiro sobe-se, depois desce-se".
O vale fundo traz a ribeira que lhe dá o nome desde a confluência de outros dois, o da ribeira da Sardeira que vem dos lados do Trevim (monte mais alto da Serra a 1200 m de altitude) e o da ribeira do Candal, até ao Castelo da princesa Peralta (bela história, é só ir à net). A orientação é Este-Oeste. Isto é muito importante porque pela manhã o Sol, ao nascer, espreita pelo vale abaixo e à tardinha recolhe os últimos raios que por ali ficaram. Pela manhã sobe-se com o nascer-do-sol em frente que, à tarde, é substituído pelo por-do-sol na descida, em sentido inverso. Esta circunstância transfigura o vale ao longo do dia e das estações do ano.
Se a isto juntarmos a dinâmica das neblinas que, ora se encaixam no fundo do vale, ora se espraiam subindo as encostas, mais os aromas quentes da caruma e da urze no Verão, das acácias em Fevereiro, ou o cheiro intenso e visceral da terra e da erva após as chuvas de Março, e os odores húmidos a fungos do Inverno, é fácil imaginar o cenário em constante transformação.
Por isso nunca me canso de pedalar pelo vale.
Às vezes, avistam-se javalis, ginetas e veados .... São sempre encontros fugazes, olha vai ali um ... já passou. No Outono, na altura da brama dos veados, já tenho ouvido os bramidos dos machos (no primeiro segundo ficamos confusos a pensar como é que um comboio vai a passar ali em cima na serra mas, uns segundos depois, percebemos que tem que haver outra explicação para aquele som que ecoa pelo vale).
Os encontros só não são fugazes em situações raras:
Mas, começando pelo princípio, que é como quem diz de baixo para cima, ainda antes de entrar no vale, logo ao início da subida da serra, a varanda do Gevim, sob a Lousã, serve para começar as lavar as vistas (e para beber um golinho de água no Verão):
O vale surge umas curvas mais acima, quando se avista o castelo
(agora visto de cima para baixo para se perceber o percurso sinuoso e fundo da ribeira)
há uns sítios interessantes por ali, à volta do castelo
E cá de cima, da estrada sob o castelo, o miradouro da Sra. da Piedade (obviamente o castelo tem um miradouro)
espreitando
Além, do outro lado, há um belo caminho que frequentemente é alternativa à subida por aqui, pelo asfalto
sobretudo no final do Inverno, depois das chuvas de Março. Mas esta é outra história. Fica para outra altura.
Voltemos ao vale da ribeira de S. João e vamos subindo com o Trevim em frente, lá em cima, a 1200 m sob as nuvens
antes que as nuvens baixem
e encham o vale de luz coada e anoiteceres precoces
As aldeias abandonadas em ruínas ficam com ar fantasma, como deve ser.
Apesar da neblina pousada sobre o vale, muitas vezes, subindo há sempre um pouco mais de azul (lá ao fundo, no horizonte, a Serra do Caramulo)
Nem sempre isto acontece nos meses frios.
Há Dezembros luminosos, cheios de sol no vale
que dão vontade de sair da estrada e seguir pelos caminhos
para matar saudades da luz do último Setembro,
do céu aberto de Junho
ou do sol hesitante de Maio ...
... e há Dezembros gelados e chuvosos, em que os caminhos permitem testar se tens ou não "guts"
e a estrada está ideal para testar os travões (a descer)
Dezembros cheios de luz opaca
e nos caminhos ficam marcadas as pegadas de outros viajantes, estes com quatro patas e umas belas hastes a encimar a caixa craniana.
A certa altura, logo depois da casa dos cantoneiros
avistam-se no lado oposto algumas aldeias serranas, as aldeias de xisto da serra. Neste caso, o Casal Novo (poste bonito, este - já não há postes de electricidade assim, em ferro).
Subindo um pouco a encosta à esquerda do vale, a aldeia é mais óbvia no meio de tudo o resto !
Aqui, outra aldeia, o Talasnal, visto lá de cima. Ao fundo, no horizonte, o cabeço da Ortiga (com "O")
Ah, as chuvas de Março e de Abril. Gosto muito do vale depois das chuvas de Março a fechar o Inverno. Noutras paragens as águas de Março fecham o Verão
https://www.youtube.com/watch?v=WaU0gDSmi84
Ouvem-se cascatas lá no fundo no vale. Algumas apenas se vislumbram mas o som da água a correr enche o vale.
Até na estrada de asfalto se formam cascatas
riachos tímidos no Verão com aspirações a ribeiras depois das chuvas a fechar o Inverno
as árvores, os arbustos, a erva, a minha bike (neste caso com uma concentração de cloreto de sódio um bocadinho mais elevada do que o ambiente).. ficam brilhantes e húmidos
a ribeira lá no fundo
recebe riachos que se formam extemporaneamente nas encostas
depois da chuva, visto de cima, já a caminho do Trevim, o vale fica assim:
já a preparar a exuberância do Verão
No Outono, os encantos são outros ( a árvore à qual a bike está encostada é uma sequóia !).
Fofos e macios
(nem sempre é assim tão fácil apanhar as castanhas, os soutos localizam-se nas encostas abruptas do vale)
Quase sem se dar conta, o vale morre, ali aos pés do Trevim, na confluência das duas ribeiras que dão origem à de S. João:
aqui estamos a cerca de 2 km do Candal, a única povoação atravessada pela estrada Nacional (N236) que liga Lousã a Castanheira de Pêra
belas rampas por ali à volta
(PS. no Candal, a água da fonte da ribeira é mais fresca do que a da fonte na estrada)
Se a viagem continua serra acima, num passe de magia, quando chegamos lá em cima, ao Trevim
olhamos para baixo, para o vale e ... é isto !
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