terça-feira, 31 de dezembro de 2019

A última nas falésias Alentejanas

Costa Sudoeste Alentejano

Foi há 5 anos que por lá pedalei a última vez. Depois de ter percorrido as falésias Alentejanas anos a fio, essas pedaladas são memórias que não vão, pelo menos nas mesmas circunstâncias, sofrer updates.

Depois do almoço (excelente, nem é preciso dizê-lo) feito para as madames que, entretanto, se espraiavam nas areias da praia quase privativa, entalada entre rochas e onde se podiam permitir, de modo tranquilo, que os raios de Sol banhassem todas as partes do corpo, inclusivamente aquelas onde o Sol normalmente não bate, e se banhavam nas ondas e piscinas naturais, por entre estrelas do mar, algas, polvos, mexilhões e etc, punha-me a andar para voltar ao pôr do Sol.
Do cabo Sardão para sul até à Carrapateira ora percorria os labirínticos caminhos das falésias, sob vento forte ou sob brisa, ora mais para o interior do Alentejo, em direcção à serra de Monchique, sob Sol quente, temperaturas muito altas, por campos de estevas que brilhavam, como que mil espelhos que reflectiam o Sol e me incendiavam a cabeça, inebriado pelo aroma intenso da resina que, de tão quente quase que se via a evaporar, a minha pele molhada do suor, o ar quente que entrava em golfadas pela boca quando subia algumas rampas - ah pois, é que na planície alentejana há altos e baixos - os caminhos de pó do interior para logo voltar às falésias e à brisa, e aos recantos com ecossistemas quase intactos (e bem os conheci com o mestre da pesca artesanal local) e o mais que a memória vai desfiando de tantos anos por ali ...
Mas let's look at the trailer, quer dizer, às fotografias avulso encontradas ao acaso por entre milhares que por lá tirei. Estas tiradas com um tlm Nokia mas a maioria, as belas, feitas com uma máquina a sério.












Ao final do dia o regresso a casa. A casa na falésia, mar ao fundo, um espelho da última luz do Sol. A casa, como um farol, iluminada por um candeeiro de luz amarela mortiça, guiava-me as pedaladas na escuridão dos caminhos.


Eu, um pedalante das serranias, fui também das falésias alentejanas. Talvez por isso, ainda hoje, ao pedalar nas cumeadas das serras tenho sensação de, ao olhar para os vales que se extinguem no horizonte, sentir que velejo sobre o mar.

sábado, 21 de dezembro de 2019

And now, e uma vez que David Attenborough não pôde vir, a BBC Natural History Documentary by o Ciclista Extraordinário



O ciclista extraordinário foi passear. Para um lugar bonito, como ele gosta.

Logo no início da subida da serra, pela N236, percebia-se que das encostas jorrava água por todo o lado. Depois eram árvores caídas, ramos na estrada, o som do vento misturado com o da água furiosa nos ribeiros em fundo, pedaladas lentas contra o vento mas, e esta era a parte que fez o ciclista extraordinário começar a pedalar serra acima, estava prevista um aberta de duas horas. Duas horas sem chuva. A chuva gera alguma inibição. Não por ele, como qualquer ciclista entende, mas pelo material; a chuva e a lama provocam stress na bike.

Com um bocado de sorte - pensou o ciclista extraordinário - chego à Fonte Espinho sem chuva e, uma vez aí, faço o videozinho, caminhando riacho acima. Ao contrário do que é habitual, as previsões do ciclista extraordinário confirmaram-se.

O ciclista extraordinário chegou ao riacho e pôs-se a caminhar riacho acima, p'raí uns 50 m, com sapatinhos de sola de carbono e aplicações metálicas, no chão húmido e escorregadio. Mas fê-lo com a determinação de quem tem uma missão a cumprir: o documentário para o Bate o Vento Sopra a Chuva Natural History Unit.

Sir David Attenborough teria ficado orgulhoso do ciclista extraordinário, quero dizer do videozinho feito pelo ciclista extraordinário: a força do riacho, a elegância da água a contornar pedras e árvores, o caos à volta, belíssimo, as coberturas clorofílicas das pedras, o chão de folhas de castanheiro, o vento na copa das árvores ... tudo isso está lá. Mas e a trepidação da câmara em cada escorreganço, a falta de focagem e ... ? Who cares.







quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

Brancos, atentos, imóveis, seráficos

Novembro 2019

O caminho estava livre. Eles estavam nas bermas, como que a convidar a passar. Foi isto que achei estranho: porque raio deixam o caminho livre? Isto é um convite ou uma ameaça? De resto, nada de anormal, lobos brancos na serra é uma imagem que o meu cérebro facilmente constrói. Sobretudo em dias neblínicos. Penso nisso e vejo-os. Nada de anormal. A realidade à nossa volta é uma construção do cérebro. E o cérebro, como é bem sabido, muitas vezes, constrói as imagens preenchendo os espaços que faltam de modo a oginar uma iagem oerente (if you know waht I mean).

- Posso? Eu não perturbo, quero apenas pedalar pela floresta nelínica
- RRRRRrrrrrrrrrrrrrr  (um)
- RRRRRRRRRRrrrrrrrrr (o outro)

Pus-me a assobiar a rama ó que linda rama como quem está descontraído e avancei na primeira pedalada. Deslizei um pouco. Travei e devido à humidade as pastilhas chiaram nos discos. Um deles mexeu uma orelha. O outro imóvel. Segunda pedalada. Imóveis. Devagar, o meu par é o mais lindo que anda aqui na roda inteira e outra pedalada. Levantaram-se ambos ao mesmo tempo. Um de um lado da bike e o outro do lado oposto. Enquanto olhava para um, virando a cabeça, perdia o ângulo de visão do outro. Estivemos ali algum tempo. Por vezes, quando olhava de novo, percebia que tinham mudado de lugar, e faziam-no rapidamente sem eu ter tempo de os seguir com o olhar. Ora logo ali junto à minha perna, sem desviar os olhos do meus, logo depois junto às árvores mais afastados. Ambos neste vai-vem furtivo. Eu imóvel, apenas rodando cabeça para, em vão, os acompanhar. Até que um deles roçou-se, encostou o focinho à minha perna. Contraí os músculos da perna sem saber se a devia desviar ou manter-me imóvel. De súbito senti um liquido quente na outra perna. Ao mesmo tempo no ar ficou um odor aromático com travos de vinagre e lima. Olhei, o outro tinha ainda a perna alçada sobre a minha e ejectava os últimos jactos de urina já esparsos. Depois abanou-se como quem sacode as última gotas. Tinha-me marcado. Afastaram-se. Como que um salvo-conduto, um passaporte para a floresta neblínica.




Desapareceram num ápice. Olhei à volta, de um lado para o outro, pareceu-me ver uma cauda branca por entre as árvores, diluindo-se na neblina também branca. Fiquei parado em silêncio. O aroma vinagrete continuava no ar.



Depois os pêlos da minha pele voltaram à posição normal, o coração o mesmo e segui, floresta adentro. A floresta estava belíssima. Apenas uma dúvida me assaltava a mente: será que o odor sai com o banho, é melhor usar sabão azul ou o gele de banho é suficiente?








Time to go home, se houvera quem ensinara quem aprendia era eu ...




quinta-feira, 28 de novembro de 2019

O dia tem que começar de alguma maneira


nem que seja andaregar (andar + escorregar; o que esperar de um passeio por ali em sapatinhos de sola de carbono com "cleats" de metal?) pelas margens húmidas dos riachos, contornando troncos e pedras cobertas de florestas de musgo (é o que parecem quando observadas de muito perto), pisando folhas mortas ao som da música espectral em Mi bemol furioso, resultado da água que se precipita encosta abaixo, procurando o caminho mais curto, o qual, como toda a gente sabe (bem! excepto aqueles que nunca se enganam e raramente têm dúvidas), nunca é a recta. É que vida é feita de pequenos nadas, quero dizer, pequenas curvas.

 

domingo, 24 de novembro de 2019

Enquanto o Inverno vai e vem

eu também (vou e venho) mas em contraste de fase.

6 momentos em que lá fui (à serra):










Got it?





domingo, 17 de novembro de 2019

Raposa na invernia

Novembro 2019


O tempo estava ruim. À medida que subia a serra a temperatura lida no computador da bike ia caindo: 12, 11, 8, 6 °C ... e foi a última vez que o li porque com receio que a chuva o estragasse guardei-o no bolso do casaco. O nevoeiro assapara-se com força a partir dos 700 m de altitude. Denso, impenetrável à vista a meia dúzia de palmos do guiador da bicicleta.



Um dia bom para encontros imediatos com os habitantes de quatro patas da serra - pensei. A certa altura senti um aroma forte. Seguramente que andavam por ali. Ia atento a ruídos. Sob a acção do vento, as gotas de água caídas das árvores sobre as folhas no chão faziam-me olhar em expectativa. Às tantas, um vulto. Tinha a certeza, um animal pequeno, cauda exuberante, rápido ... uma raposa. Parei a bike e ocultei-me atrás de um grande cedro, tirei o telemóvel, pressionei vídeo e, lentamente, saí de detrás do cedro apontei para o local onde me parecera que tinha visto a raposa e  ... lá estava. Ela imóvel, percebeu-me. O nevoeiro fazia uma cortina branca que dificultava a visão. Percebi que me olhava. Ficou imóvel durante uns instantes (eu também) e, depois (no vídeo aos 15 s) desapareceu mata abaixo. Fiquei ali uns segundos na, bem o sabia, vã expectativa que ela voltasse ou que surgisse outra.




De resto foi continuar a subir e gozar invernia como quem pedala num dia de Verão à beira-mar. Depois, nestas coisas, atinge-se o estado: daaasssss isto está a ficar mau ...  A descida da serra foi feita pelo estradão da floresta. Poças de água e lama com fartura. O friozinho do costume. Chuva. A agitação do animal acossado. Muito ainda para descer (estava aos 700 m de altitude). Mas, era irresistível,  parei, tirei a luva da mão direita e disparei o telemóvel:



a road to nowhere



As clareiras clorofílicas na curva do caminho


Que bela invernia !






sábado, 9 de novembro de 2019

Outono azul nas terras altas da Estrela

Outubro 2019
(Serra da Estrela)


Nem amarelos nem laranjas. Antes azuis longínquos, cores graníticas e verdes de urze brava, tudo sob um ar limpo, cortante e fino: as Outúbricas cores nas terras altas da Estrela.








As pedaladas levaram-me à Torre, aos 1993 m de altitude. Fui ao Centro Comercial (pois, na Torre há um Centro Comercial!) e, num dos vendedores de queijo e presunto, pedi para me arranjarem um bocadillo de jámon faxavôr. Mais uma Coca cola e o repasto ficou em 4 euros. Come d'habitude fui para o lado Este olhar as serranias a perder de vista que se estendem do Açor até à Lousã. O esqueleto dorsal montanhoso e oblíquo do país.
O ar cortante mete-se pelo corpo adentro, provocando-me um arrepio que começa nos pés e se propaga até à cabeça, como num cão que se sacode.


O Picoto da Cebola, o cone quase-perfeito à esquerda e, na linha do horizonte à direita, a serra da Lousã. Olho e parece-me improvável que já tenha pedalado por aquelas cumeadas, embora o tenha, de facto, feito. Do Picoto de Cebola ao Trevim. Do Trevim ao Gondufo. Ao Colcurinho, Ao S. Pedro do Açor. No Verão e no Inverno. Pedaladas quase todas solitárias. É que parece irreal pôr a memória dos detalhes das pedaladas em cima do horizonte tão longínquo. E já por ali pedalei muitas vezes por caminhos que daqui são imperceptíveis, ... o suor que escorre pela face, os brilhos por entre os óculos, os tojos que rasgam a pele, os músculos tensos, a água fria da fonte e do ribeiro, o aroma intenso da urze, o vento forte e o frio, a chuva que encharca os ossos, a incerteza sobre a possibilidade de regressar numa só peça, a sede, as rapinas a planar sobre a cabeça, as lonjuras que nunca ficam próximas por mais que pedale, o vento outra vez, o nevoeiro intenso que quase me desorienta, as pedras que rebolam no caminho, o espelho de água da barragem, a lagartixa que atravessa o caminho num ápice, o susto de um javali cujo vulto se esgueira por entre os arbustos, o avistamento de gamos por entre as árvores e de veados machos imponentes ao longe, o Sol intenso e o granizo que massacra a face, o pó, o suor outra vez, o som da água que corre nos ribeiros, a sede ...





P´raí umas 3, no máximo 4 horas de Sol. Planos para descer da Torre até ao planalto do Curral da Nave ou pelo lado Sul, pelo lado de Unhais da Serra, bailavam na cabeça. Desci até à Nave de S. António e aí, esperei por um impulso, um guinar súbito do guiador que me levasse para Sul ou para Este. Muitas vezes é assim: no último momento, quaisquer que tenham sido os planos delineados, os caminhos que tenha antecipado, o percurso definido, viro o guiador seguindo um impulso. Como, aliás, acontece connosco face a bifurcações de caminhos, a escolhas, um pestanejar, um aroma, uma impressão, um sorriso leva-nos por ali e não pelo outro lado.
Subi aos Piornos e voltei para o lado do vale glaciar do Zêzere, tentando seguir no planalto sobranceiro ao vale do lado direito (Curral da Nave). Do outro lado do vale ... os Cântaros (Magro, Gordo e Raso) ... uma visão tremenda, granítica.
As estrada que sobe o vale glaciar (o maior vale glaciário da Europa) como que um fiozinho branco, tal a distância. Os carros mal se vislumbram. O rio Zêzere, acabado de nascer no sopé do Cântaro Magro, corre lá em baixo por entre os pedregulhos.


Olho em frente para o outro lado do vale e a encosta granítica parece estar logo ali, dois palmos à frente do guiador da bicicleta. Your'e wrong my friend. Estará a cerca de  2 Km de distância, aquelas pedras têm centenas de metros de altura.



Andei por ali um bocado perdido, pelo Curral da Nave. Lentamente fui aproveitando caminhos para pedalar em direcção Sul. Teria que descer para Verdelhos, pois este seria o percurso mais rápido para evitar que a noite me apanhasse na serra. Os ramos do pinheiro esculpido pelo vento indicavam a direcção !

Sabia aproximadamente a localização do Poço do Inferno e sabia também que daí conseguiria apanhar sem dificuldade um percurso para Valhelhas. Descer para o Poço do Inferno sem grandes demoras, era a ideia que me ocupava pelo menos 50% da mente. Grande parte dos outros 50% estavam centrados nos ruídos de protesto do meu estômago. O pão e o presunto devorados na Torre eram já uma vaga recordação - alguns dos carbonos da glucose contida no amido do pão tinham há muito sido já exalados para a atmosfera na forma de dióxido de carbono, gás de estufa como é sabido; pois!, é que na produção de energia a partir de alguns alimentos, nomeadamente glucose, produzimos dióxido de carbono que, sendo "lixo" do metabolismo, exalamos para a atmosfera. Por outras palavras, para vivermos temos que "carbonizar" a atmosfera. Ah, é verdade e libertamos calor. Aqui não há volta a dar, não podemos "descarbonizar". Quem mais come carboniza mais.
Tinha no bolso uma merdelhice de uma barra energética. Nem sequer verifiquei a data de validade não fosse ter já passado. Marchou e carbonizou. Olhei à volta, procurei referências na memória, reconheci uma garganta entre penedos e, ao longe, um bosque de pedaladas anteriores (do outro lado do vale, ao cimo da encosta, a pousada de S. Lourenço; em baixo, no vale, fora do alcance da vista, Manteigas). Estava orientado; descendo por ali iria dar ao Poço do Inferno.


Pedalei até ao cabeço em frente, cheguei ao bosque e ... o Outono azul transformou-se. Assim:


e ficaria por ali às voltas não fosse a pressa de encontrar o caminho para Verdelhos. Estive ainda uns minutos em silêncio, perscrutando a vegetação densa na expectativa de ouvir o ruído de um galho a partir, de uns cascos a pisar as folhas secas, de uma respiração ofegante. E ficaria por ali a disparar o telemóvel não estivesse já em modo de poupança de energia.





O Poço do Inferno (o plano deu certo) era um fiozinho de água nada ameaçador. Nem sequer fui lá acima atravessar a ponte entre os penedos.


Sabia pelos tons da luz, pelas sombras da floresta que o Sol estava já baixo. Não era preciso sequer olhar o céu.


Foram depois pedaladas apressadas. Muitas pedaladas. Subi, desci para o vale de Verdelhos, subi novamente e olhei para trás, para o planalto na linha do horizonte de onde tinha vindo e que em breve iria servir para o Sol se pôr. Olhei as curvas da estrada que tinha feito desde Verdelhos. Faltavam-me ainda cerca de 20 Km.


20 km asfálticos feitos em modo smooth como quem desacelera os neurónios responsáveis por reagir ao inesperado e liga os back to business as usual.

sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Novembro chega (como deve ser) neblínico

1 Novembro 2019
Serra da Lousã

Apenas o tempo suficiente para subir a serra pela EN236. E, caso pedalasse bem (o que nem por isso e tal), daria ainda para descer pela floresta. Chuviscos, tempo quente e húmido, neblinas sobre a serra .. vamos lá a isto e ver se consigo dar a volta pela floresta. À hora a que deveria estar de regresso, pedalava ainda aos 900m e caía-me em cima uma chuvada da grossa. Daaaassaaassss ... e eu a pensar que me safava. O problema, obviamente, não é molhar-me mas sim o equipamento e a bike que requererão um tempo dos infernos para secar, limpar, lubrificar e etc, de modo a ficar tudo como deve ser para amanhã. Pois, que amanhã é Sábado e espero dar umas pedaladas com mais tempo. E amanhã a probabilidade de chuva é o dobro da de hoje, 100%. Portanto, tudo tem que estar impecável de modo a que as horas previstas debaixo de temporal sejam passadas ..., bom quero dizer, que sejam passadas sem ter que cerrar os dentes, proferir umas expressões tabernáculas and so on. A chuva intensa deixou-me a fazer contas de cabeça; ora, 3 vezes nove vinte e sete noves fora nada, e já pedalei um bom bocado e, às tantas, se virar para baixo escapo ao temporal e o equipamento e a bike precisarão apenas de uns toques para ficarem operacionais (entretanto ia subindo e levando com mais chuva) e ... olha uma raposa (uma raposa na estrada a 5m depois da curva assustou-se quando me viu e fugiu encosta abaixo) e, nisto, parei, fui espreitar e pronto que se lixe, viro para baixo. Entretanto, enquanto virei e não virei disparei o telemóvel (low batery, ora porra só posso fazer meia dúzia de disparos) à volta meia dúzia de vezes. E à volta era assim, em meia dúzia de disparos, do lado de cima e do lado de baixo:




e assim





curva à esquerda

(a raposa pisgou-se or ali abaixo)



Do lado de cima


e do lado de baixo


and time to go ... down.



P.S.: Afinal foram 9 disparos, meia dúzia e meia.

quinta-feira, 17 de outubro de 2019

O ciclista extraordinário foi à floresta ver as árvores no Outono

Serra da Lousã
Outubro 2019

O ciclista extraordinário partiu do cais da vila, navegou sem sobressaltos pelas águas calmas do asfalto até Vale de Nogueira e, depois de dobrado o cabo que dá entrada no vale da ribeira da Fórnea, aguentou com o alteroso caminho de pedras e tojos, mantendo o ritmo e o rumo, para Sul, para cima, Sol nos olhos, vento intenso de estibordo, braços recolhidos, os oscilantes ramos altos dos cedros a lembrarem-lhe que serra adentro, afastando-se da protecção das terras baixas, a navegação seria cada vez mais difícil. E o ciclista extraordinário manteve o rumo. As vagas de vento empurrando-o mas dentes cerrados e lá foi - com ligeiras exposições flanco, ora de um lado ora de outro mas lá foi indo - até avistar a orla da floresta.

O paradoxo. Quando o ciclista extraordinário chegou à floresta das grandes coníferas encontrou uma calmaria, uma floresta silenciosa, seca e murcha. Sem alísios nem trinados. Sem grunhidos nem bramidos. A flat forest.  Este Outubro na serra com a lua em quarto crescente que haveria de vir mais tarde deixava o ciclista extraordinário mergulhado em extraordinária solidão.


(Astor Piazzola com Antonio Agrí - Soledad)

Apenas aqui e ali o ciclista extraordinário encontrou as cores do Outono. Sobretudo quando o Sol surgia por entre as nuvens dando um pouco de cor às folhas das árvores que o reflectiam, brilhando. Foi nessas condições menos murchas que o ciclista extraordinário disparou o telemóvel para captar um rectângulo do que à volta via. Noutros anos o caminho era atapetado de folhas outonais com 16 milhões de cores (ou até um pouco mais).





E o ciclista extraordinário para ali esteve a olhar as árvores.

... have your leaves all turned to brown
will you scatter them around you ...
"C'est la vie"
(Greg Lake)


Esperando que a luz que ia e vinha colorisse um pouco mais aqui e ali.



Dando mais umas pedaladas sem grande ânimo o ciclista extraordinário reparou nas poças de água no leito seco das ribeiras que serviam de bebedouros aos animais da floresta.



O ciclista extraordinário pensou em anos anteriores, anos em que o Outono trazia tapetes de ouriços e castanhas. Aqui e ali alguns mas tímidos.



As virginais castanhas pequenas e sem a exuberância de outros Outonos.


No dia seguinte o ciclista extraordinário voltou à serra. O tempo mudara e as primeiras neblinas assapavam-se sobre os vales. E, às tantas, o ciclista extraordinário teve a sensação de estar no Inverno -  de que gosta, diga-se - mas chateado com a ideia de o Outono ter sido fugaz.


De tal modo distraído com a paisagem brilhante da luz coada pela neblina, o ciclista extraordinário só deu conta do arco-íris quando olhou para trás, para o vale de onde tinha partido.


A memória do dia anterior estava pouco consolidada, a visão global da floresta era difusa, lembrava-se apenas de uns ramos aqui, umas folhas ali ...