quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Dos caminhos úrzicos aos sôuticos

Serra da Estrela
Novembro 2017

A continuacion depois da subida à Torre, já na descida, pedalando pela estrada, quando passava pelos Piornos, os caminhos graníticos cobertos urze do lado esquerdo, do lado do planalto que se estende até Manteigas, foram um chamamento irresistível. O vento trazia-me o som doce de cítaras e sonoras flautas tocadas por musas incautas, de cabelos de ouro, correndo e acendendo o desejo ... bem, quer dizer, a continuacion, nem dei conta. Quando dei por mim ia já no planalto a rodar no chão que conheço bem. Conheço-o de outros tempos, dos tempos em que por ali havia rebanhos, centenas de cabras e ovelhas e cães da serra grandes com coleira de picos que, percebendo-nos a km de distância, vinham ter connosco, mandando-nos dali para fora (com modos de cão da serra com coleira de picos, bem entendido). Tempos em que me perguntavam: mas o que é que vais fazer para a serra? E, na altura, seguindo o conselho de Pitágoras (tout n'est pas à dire), nada explicava porque estava seguro que às minhas palavras seria devolvido um olhar de estranheza e perplexidade (mas o que raio é que este gajo está a dizer, a falar das pedras e do vento e das raízes e do céu à noite  ...?)



Agora há por ali um estradão de terra.



Percorrendo-o, dei com um dos "casais" usados para a pastorícia a grande altitude; uma pequena casa de pedra com coberto de colmo para os pastores e um curral adjacente. Em ruínas. Lembro-me destes planaltos acima dos 1400 m de altitude cobertos de ovinos a pastar.





Depois de velejar por ali, pelo planalto, estradão que não gerava preocupações de maior, uma travagem aqui, outra ali mas sem stress, mais ou menos plano, à bolina, por entre pedregulhos em equilíbrios impossíveis, o caminho estreitou-se e comecei a descer.


Logo depois, num passe de magia, ainda mal refeito da tensão que apanhei na descida, desviando-me de regos e pedras, travagens bruscas, equilíbrios para manter o centro de gravidade na bike, vi-me a percorrer caminhos por soutos a meia encosta.




Estava na hora de repor a glicémia com umas belas de uma castanhas. Frescas e boas, acabadas de sair dos ouriços (o cleat the metal do sapato de encaixe é um excelente extraidor de castanhas de ouriços, poupando assim os dedinhos às picadas).


Estando por ali, a olhar e a cheirar, às tantas, como acontece em tantos outros sítios na serra, chega aquela sensação estranha: se calhar é melhor ir andando, o Sol já vai baixo. Vem ao cimo a ideia de ter que ir embora.

Sigo? Por ali?



Vamos lá


Faltava ainda descer umas centenas de metros em altitude para o vale do rio Zêzere e tornar a subir para tornar a descer.
A cerca de 15 ou 20 km da chegada, ao aproximar-me da terra onde nasci, nas fraldas da Estrela, na periferia da cova da Beira, o Sol ia já muito baixo. Escondia-se por detrás da Estrela. A Gardunha, no horizonte, tinha ainda os cimos alumiados. A noite apanhou-me no caminho.



Sem comentários:

Enviar um comentário