domingo, 12 de julho de 2015

Berlim 2015

Berlim, Alemanha
(Julho 2015)

... a cosmopolita Berlim. Os rolos de tecido em cima das couve-flor e dos alhos franceses. E isto imediatamente antes de uma bancada com asas de frango (cru) e logo a seguir a uma outra de artesanato em arame (brincos, pulseiras metal ...), mesmo em frente à das postas de peixe fresco em contentores de esferovite. Se ali tivesse caído de pára-quedas ficaria na dúvida entre Berlim e as feiras em Portugal na época pré-ASAE.


Era um mercado Turco, junto a um canal. Nem as asas de frango, nem as peças de tecido me pareceram tentadoras. Comprei 1 euro de alperces que lavei logo ali numa torneira no meio da rua.


Aluguei a bike por volta das 10 da manhã e o plano era, como habitualmente, muito rebuscado: ter 1 ou 2 pontos de referência e depois logo se via por onde me levariam as pedaladas.

Este era um dos pontos de referência: as portas de Brandeburgo


Eu, que sou um tipo do pop/rock e, mais até, do rock sinfónico, deleito-me com os concertos de Brandeburgo de Johann Sebastian Bach.

O dia estava magnífico. Depois da tempestade que se tinha abatido sobre Berlim na noite anterior, poucas horas após a minha chegada, com chuva torrencial


raios a cruzarem-se no céu de Berlim (lembrava os holofotes que durante a segunda-guerra varriam o céu, procurando aviões inimigos), a manhã estava quente com temperaturas acima dos 30 °C.

Segmentos do "muro de Berlim" era outro dos pontos de referência.


Embora se encontrem pedaços do muro em vários locais como, por exemplo, na praça Potsdamer.


Cheguei à praça Postdamer em grande estilo. Devidamente equipado com calças de ganga arregaçadas, sapatinhos de caminhar em alcatifa, meias, camisa (sem gravata) e o mapa de Berlim no bolso. Telemóvel no chão encostado a um poste, 20 s no temporizador, voltar à bike e clique. Uma das coisas interessantes em Berlim é que, dada a diversidade cultural, de hábitos, idades etc etc ninguém acha estas encenações estranhas. 
O Hotel Ritz-Carlton em pano de fundo.


e, logo ao lado, a Praça Sony. Já uma vez ali comi uma bela de uma salsicha acompanhada de uma  não menos bela cerveja !
(também ninguém achou estranho entrar por ali adentro de bicicleta)


À primeira vista, a articulação das faixas para bicicletas com as dos carros parece caótica e perigosa. No entanto, é ao contrário. É extremamente fácil pedalar em Berlim. É seguramente a melhor maneira de visitar a cidade. Ao fim de 15 min, depois de percebermos umas regras básicas (por exemplo, há semáforos apenas para bicicletas e outros para peões e bicicletas) andamos por ali "ábrir" atrás dos outros ciclistas com um à vontade que nos surpreende. Aliás, vêem-se famílias a pedalar (pais com miúdos pequenos) cada um na sua bike. Os carros não mudam de direcção sem verificarem se vem algum ciclista.

A circulação em bicicleta em Berlim não é uma moda. Nota-se claramente que é um hábito enraizado (novos e velhos, bem e mal vestidos, à chuva e ao Sol). Não há um local onde não haja uma faixa para a bicicleta.
Há estacionamentos para bicicleta em todo o lado, nas lojas, hotéis, escolas, casas, nas ruas ..... há bikes por todo o lado:


Sem bidão para a água e com o calor a apertar tive que a muito custo arranjar um plano alternativo: abancar numa esplanada para comer uma omelete com salada e beber uma cerveja! Cheguei portanto à conclusão que em Berlim, quando saímos de bicicleta, não é necessário levar géis/barras/electrólitos ... e outras merdas do mesmo género!


Procurei um sítio para um café e acabei aqui. Esta é outra das coisas interessantes em Berlim, a busca do diferente. Há lojas surpreendentes. Este era um café, ou bar ou algo do género com várias merdelhices por ali espalhadas, mas tudo com bom gosto e café delicioso. Pedi um espresso e ... deram-me um expresso: 5 ml (mais ou menos meia colher de sopa) de café no fundo de uma chávena que levamos à boca e ainda vamos a meio do trago e já se acabou o café.


A entrada (cuja degradação contrastava com a elegância do interior) não era óbvia. Entrava-se por um beco onde havia umas mesas e onde encostei a bike


Os canais em Berlim têm um ar bucólico que contrasta com as grandes avenidas e a agitação nas ruas.



Como se vê a bike era topo de gama! Muito mais apropriada para uma jovem vaporosa de cabelos e vestido a esvoaçar e com um cesto de flores e vegetais do que para um "mamil" (é só ir ao Google) de calças arregaçadas.


Este, que é um local ícone de Berlim, encontrei por acaso. Ia a pedalar, vim uma placa indicando: "checkpoint Charlie" a 450 m. Vrrrmmmmmmm está a virar nesse sentido.



Durante a guerra fria, este era um local de passagem no muro, controlado por ambas as partes (bloco soviético e aliados/NATO). Entre outros aspectos ficou famoso em 1962, ano em que um jovem tentou passar sem êxito de Berlim Este para Oeste. Foi atingido pelos soldados do lado soviético e ficou ali enrolado no arame farpado, na terra de ninguém, a esvair-se em sangue durante umas horas porque nenhum dos lados se atrevia a ir lá. Quando o fizeram já estava morto. Parece que os tipos que o alvejaram foram condenados em 1990 e tal a 1 ano ou 2 de cadeia.

Na altura era assim (fotografia num pequeno centro de visitas ao lado que descreve a relevância histórica do local).


De vez em quando, e a muito custo, parava quer para remover quer para repor líquidos.



Sempre de olho na bike.


Pedalei por avenidas cheias de trânsito


sem qualquer receio


parece perigoso mas não apanhei sequer um susto, pedala-se ali com segurança


pedalei por baixo de viadutos que me lembravam o filme "laranja mecânica"


por praças abertas, periféricas, desertas e luminosas


outras mais fechadas, centrais e cheias de turistas (a prova de que isto não é em Pequim é a torre ao fundo)


telemóvel no chão encostado a um poste ...  e uma para lá (eu sou o do corte de cabelo tipo afro)


e outra para cá


pelo cemitério judeu


junto ao parlamento


por avenidas centrais mas com pouco trânsito


por avenidas periféricas com carros a grande velocidade


Tive que ir para a periferia da cidade  porque queria visitar a maior loja de bikes da Alemanha (a Stadler) !!! Bicicletas no corredor central e equipamento e componentes nos laterais. Decidi que só andaria por ali 1 hora. Cumpri com um erro de cerca de 30%. Talvez 40%.


Pedalei pela tarde dentro




com o Sol já a cair



Tinha que pedalar de volta ao sítio onde alugara a bike (praça Hemann, no bairro Turco). De súbito, para o final da tarde, as ruas encheram-se de grupos de ciclistas que conversavam como se estivessem numa esplanada (provavelmente pessoas vindas do local trabalho). Quer dizer, também há hora de ponta para as bikes !


De súbito começaram a chegar umas nuvens negras e a memória da tempestade da véspera começou a injectar adrenalina nas veias e mais rotação nas pernas. Caso caísse uma chuva torrencial, andar de de mapa numa mão, conduzindo a bike com a outra, a vários km da praça Hermann, tornava a situação ... fluida.


A bike não tinha luz e a tarde morria


Pedalei à bruta de regresso mas, como é sabido pelos pedalantes de duas rodas, pedalar com calças e cuecas com calor durante horas não é propriamente uma boa ideia e a dor entre-pernas e arredores não ajudava.
O céu estava cada vez mais ameaçador. Até que reconheci a avenida com a catedral ao fundo que me levaria ao bar onde aluguei a bike. Um bar de um Turco com quem negociei o aluguer da bike. A mulher fazia o negócio enquanto ele bebericava na esplanada. Dez euros pelo aluguer mais 50 de fiança, disse-me ela. 50 de fiança, eh pá nem penses. Troca de olhares entre mim e ela para medir a convicção. E os olhares da Turcas não são fáceis !!! Tem que ser, diz ela (ah, eu não falo Turco e ela mal arranhava o Inglês). Come on, I´m there at that hotel just in front, disse eu, esboçando um sorriso que tentava ser arrebatador :). Ela (à volta dos 40, muito bonita) franziu ainda mais as sobrancelhas grandes e escuras que lhe marcavam a face. Chamou o gajo que estava lá fora. Falou rapidamente com ele em Turco. Troquei olhares com ele e percebi que tínhamos entendimento. Deve ser alguma coisa que nos está nos genes, este entendimento com pessoas de outras culturas. Temos uma história multi-cultural e isso marcou-nos. Levei a bike sem pagar a fiança.


Quase a chegar e já pingava. Ia repetir-se a cena da noite anterior, seguramente.


Eram 9 menos um quarto. Alugara a bike às 10.  Onze horas a pedalar por Berlim. Pareceram-me apenas 2 ou 3. JA chuva entretanto começou a ficar mais generosa.


Entreguei a bike ao Turco com um sorriso que ele me devolveu. Estava de novo a pé. Na praça Hermann. Depois de muitas horas a pedalar na bike, quando desmontamos quase que temos que reaprender a andar. Ficamos descordenados, mexemos as pernas sem convicção e temos que pensar em colocar uma à frente da outra, mantendo o equilíbrio com o tronco.


a chuva era já intensa. Daí a pouco o céu estava de novo incendiado com raios.






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