sábado, 21 de outubro de 2017

As folhas secas de Outubro

Serra da Lousã
(Outubro 2017)

É Outubro. É Outono. As estações do ano são uma construção nossa determinada pelo movimento relativo da Terra à volta do Sol e pela inclinação do eixo da Terra relativamente ao Sol. A Terra recebe mais ou menos radiação, mais perpendicular ou mais oblíqua. Mas isso não interessa para o Outono. Nem para nós. O Outono é a memória do que tem sido. Temos o Outono na cabeça. Fumo de castanhas assadas que invade as ruas molhadas com carros a passar, gorro na cabeça para aguentar a chuva miudinha, luz baça ao fim do dia, as podas necessárias para, na Primavera seguinte, rebentarem as flores e frutos, terras e agriculturas que se amanham e preparam, folhas tingidas de amarelo, laranja, castanho e mil gradientes destas, o lume aceso, lenha que se armazena para o Inverno, chás quentes e mantas enroladas, livros lidos em mãos frias... cada um tem o seu Outono na memória. É a memória que fabrica os desejos e gera as expectativas.

O Outono na serra da Lousã, diz-me a memória, é um deslumbramento. Pedalar no Outono pelas florestas da serra, como já tantas vezes fiz, consolidou a memória do Outono na serra que, sem arte e engenho para o descrever, é melhor ficar-me por aqui. Como é que num texto vou juntar as cores aos aromas, a luz que se mete por entre as árvores à brisa que faz oscilar a folhagem, a neblina ao vulto fugidio por entre as árvores ou o chilreio dos pássaros às imagens eróticas das castanhas a sairem dos ouriços semiabertos num acto virginal?

Este ano as folhas caem não porque é Outono, e lá iriam elas em gradientes de laranja, amarelos, castanhos pousar no chão, mas porque estão secas. Secas como se tivessem sido postas num forno. Não caem moribundas, ainda com algum viço, ainda um pouco espessas e húmidas. Caem secas, estaladiças, sem um pingo de água, mais que mortas. 





No chão, também seco, continuam secas e estalam quando as piso com as rodas da bike.


No Outono da minha memória, a temperatura elevada que se sente (acima dos 20 graus C) não "liga" às folhas secas, aos medronhos e às castanhas. Até as castanhas são pequenas este ano.
 

Apesar dos verdes, a floresta parece moribunda. Não se vêem esquilos, pássaros, veados, ginetas, javalis ... está tudo silencioso.



Ando por ali, atravessando a floresta, ora a descer




ora a subir, pisando as folhas




a juntar memórias à memória do Outono. O Outono era húmido e frio, as folhas caíam em gradientes de mil cores, nos caminhos corriam fios de água que transbordavam de riachos ... Para o ano, a memória do Outono será diferente da que tenho tido até agora.




2 comentários:

  1. Beleza e tristeza casam muito bem nestas palavras, nestas fotografias, nestas memórias.
    A verdade é que o João é um poeta e, se calhar, nem sabe...
    Maria

    ResponderEliminar
  2. Olá João, imagens eróticas das castanhas a saírem dos ouriços nunca vi... mas descascá-las e comê-las ainda é bem melhor, penso eu de que...
    'Quentes e boas', era o pregão mais popular ali na zona do Rossio e Praça da Figueira, em Lisboa (good memories).
    Quanto às Falling Leaves, será que é este ano que vou ao Botânico de Coimbra caminhar nas folhas dos plátanos?
    🍁🍁🍁
    Maria

    ResponderEliminar