quarta-feira, 11 de novembro de 2015

O dia tem que começar de alguma maneira

Serra da Lousã
(Novembro 2015)

E foi então que apareceu a lagartixa.
Bom dia – disse a lagartixa.
Bom di … Não consegui terminar. A lagartixa estava já a debater-se debaixo das patas da gineta. A gineta saltou para cima do muro onde a lagartixa se tinha estrategicamente colocado à espera dos primeiros raios de Sol da manhã para lhe aquecer as entranhas e, num ápice, zás, pata em cima da lagartixa. As ginetas são belas e danadas. Espertas, ágeis, rápidas e mal-cheirosas. Tal como as raposas. Belas e mal-cheirosas. Cheiram a urina. Às vezes, nos caminhos mais fechados da serra sente-se um súbito cheiro a urina. Nada vejo mas sei que por ali há bicho. Acelero as pedaladas e fujo dali em alta velocidade.
Bom dia – disse a lagartixa.
Olha, outra lagartixa – pensei. Mas porque é que hoje há por aqui tantas lagartixas? Ah, espera, esta não é uma lagartixa, é preta e com manchas amarelas, é uma salamandra-de-pintas-amarelas. Daquelas que costumo ver esventradas na estrada, sob os pneus dos carros. Aqui na serra, o maior inimigo destas salamandras não são as ginetas; são os gatos vadios. Por isso, na aldeia do Candal, algumas pessoas vão lá alimentar os gatos para evitar que estes encham a pança de salamandras. Às vezes penso que as engolem de um fôlego como a minha cadela a engolir torradas com manteiga: boca aberta e aughhhgrrhg … parece um buraco no centro da galáxia a sorver as estrelas à volta. E se as engolem inteiras será que as salamandras se ficam a debater, pelo menos durante uns segundos, no estômago dos gatos? E não lhes fazem cócegas no esófago?
Gosto mais de lagartixas do que de salamandras. Manias.

Siga, mais umas pedaladas. Parece que, por agora, se acabaram os répteis e os anfíbios. Pelo menos não vejo nenhum no muro até à curva.


A certa altura tive a sensação de que a gineta voltara ao muro e me observava. Pelas costas, à socapa. Aquelas sensações que sentimos pela "espinha" acima. As ginetas não têm os pigmentos para o azul nem para o verde. Fiquei a pensar na visão do mundo da gineta.


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