(Serra da Lousã)
Os poços de neve ou os neveiros do Coentral. Na wikipédia aqui e aqui.
O Coentral fica ali (fotografias já postadas noutra pedaladas a propósito de amarelo e outras cores).
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Os poços ficam lá em cima, sobre o Coentral (à esquerda no pico com as antenas), no St. António da Neve (fotografia de Abril 2015).
Na curva do caminho, aos 1000 m de altitude, avistei pela primeira vez o St. António da Neve, por entre as árvores
O St. António da Neve tem um pico gémeo na Serra da Lousã, o Trevim. Este, o Trevim (à direita com as antenas), é de facto o ponto mais alto da serra com 1200 m. O St. António fica-se pelo 1100 e tal.
À chegada ao planalto é óbvia a visão dos gémeos; o Trevim à esquerda e o St. António á direita
Daqui, do planalto, o plano era contornar o Trevim pelo lado Sul e subir o St. António. Mais pedalada menos pedalada e objectivo à vista. Isto dantes eram uns caminhos maçã amanhados mas agora, por causa das excursões de jipes (4x4) que proliferaram na serra, aplanaram o estradão.
O St. António da Neve pela frente
e o Trevim pelas costas
Os poços da neve são uns poços para neve. Os poços cavados no chão para aí com uns 5 m de diâmetro e mais do que isso de profundidade são encimados por uma construção de xisto (pois, de que havia de ser?) circular e com tecto cónico. A altitude? são cerca de 1100 m, mais coisa menos coisa.
Cá está um poço (e um belo castanheiro)
e mais dois poços
Os poços ficam junto à capela de St. António da neve onde, ainda hoje, se reúnem anualmente os "povos da serra" numa festa no Verão (cada um ou cada grupo leva o seu farnel para partilhar com os outros).
Já pedalei até lá nestas ocasiões umas duas ou três vezes atraído pelo som das concertinas e o aroma das febras assadas. É um duríssimo teste de stress pedalar por ali acima no Verão, em esforço, e, às tantas, sentirmos o cheiro de febras assadas trazido pela brisa.
A ideia dos poços de neve era, embora insólita hoje, normalíssima há 100 e tal anos. Durante o Inverno os neveiros (profissão de alguns habitantes do Coentral) acumulavam neve no poço e batiam-na de modo a que com a pressão a neve se transformasse em gelo. No Verão, eram cortados blocos de gelo, carregados e transportados em carros de bois cobertos com sacas até ao rio Zêzere e depois, pelo Tejo, até ao Paço em Lisboa onde a realeza nos séculos XIX e princípio do século XX o usavam para o que lhes desse na gana. Pelos vistos, havia até um "neveiro real" na corte em Lisboa que coordenava e geria ("agilizava" como alguns dizem hoje) a actividade dos neveiros em vários pontos do país.
Chegar ali e dar de frente com estas construções é uma bela experiência. Em grande parte devido ao contraste da geometria circular dos poços com a geometria fractal (ramos das árvores ...) à volta. Bela tirada esta.
Cá está outra vez: os círculos versus os fractais.
Estou cada vez mais convencido que a beleza resulta do contraste já enunciado. Tenho que pensar nisto mais vezes. Até porque, ao contrário do senso comum, estou convencido que há padrões objectivos de beleza. Não é apenas a que está nos olhos de quem vê.
Mas esta é a história dos poços.
O Trevim espreita lá atrás
Vamos lá espreitar.
Espreitando lá para dentro, vi um fantasma. Era a minha silhueta na luz que entrava pela porta e via projectada na parede em frente
Cinquenta metros mais acima fica o aeródromo a maior altitude do país. Ainda antes de chegar tem-se a visão do souto on ficam os poços (ficam ali, no meio das árvores).
Logo acima, o aeródromo
Onde o horizonte para Sul se agita (agita?!), quer dizer se abre.
Quatro da tarde, o Sol põe-se cedo. Tempo para o pão com marmelada, colocar o gorro, apertar fechos e luvas e vamos embora que se faz tarde. Só faltam descer 1000 m. Descer o St. António, subir e contornar o Trevim pelo lado Norte, já sombrio e frio a esta hora
e foi ir por ali abaixo com o friozinho a cortar a ponta do nariz
Houston, Houston, do you read me Houston? Mission accomplished. Estou a entrar na atmosfera, prevejo chegada em 30 min.
João L. this is Houston, approach Lousã by South e vê lá se não te espalhas pá ...
Landing site: Lousã, à esquerda
Na floresta tive ainda um encontro imediato do terceiro grau com um veado. Atravessou o caminho uns 20 m à minha frente em dois pulos.
Foi ali. Um pulo das árvores à esquerda para o caminho, um ligeiro retomar o balanço e, depois, outro pulo do caminho para as árvores à direita. Perfeito.
Outros encontros imediatos durante a descida, normais em tempo quente, são escassos no tempo frio. E isso dá-me um grande conforto. É que no Inverno all the fucking mosquitoes die and BURN IN HELL.
Estava a chegar. Os Sol era já fraquinho, de um amarelo desmaiado a contrastar com a ponta do nariz e a minha face vermelhas ao rubro. Estava contada a a história dos poços da neve. Descia bem e muito confortável na Merida big nine team roda 29. Acho que é nestas descidas por cascalheiras e com pedras que noto a maior diferença para a roda 26. Sinto mais conforto e segurança.
Such a perfect post não pode ficar sem um comentáriozinho da Maria...
ResponderEliminarEla gostou muito dos poços de neve, dos círculos versus fractais, dos 2 saltos do veado (que não viu mas imaginou) e, sobretudo, do sentido de humor do João.
:) Maria
A ideia dos neveiros e dos poços é fascinante. Naquele local faz-se anualmente o encontro dos "povos da serra", os do lado da Lousã e os do lado de Castanheira de Pêra. A tradição é levar uma merenda para lá passar o dia. Depois, de modo mais ou menos improvisado, há música e danças tradicionais.
EliminarNos últimos anos, um update tem sido uma romaria de ... motorizadas (daquelas antigas e fraquinhas que fazem um barulho dos infernos). Vão pela serra e, se calho a andar por lá, parecem um enxame de abelhas gigantes a aproximar-se.
João
João