domingo, 28 de junho de 2015

Sexta à noite a 700

26 Junho 2015
(Sexta-feira)

Sexta à noite à altitude de 12 andares acima do nível do mar Mediterrâneo


a 700 km de casa e com a febre da bike a subir (the Friday night fever !  ah ah staying alive, staying alive - como é que esta me veio à memória?).

Em delírio, fiz o plano para Domingo: pegar na bike e sair disparado pela serra da Lousã acima até ao Trevim. Simples, eficaz e com grande probabilidade de ser um grande insucesso.
Uma semana miserável passada sentado, nem sinto as pernas com o cansaço da inactividade, a desidratar-me com bebidas alcoólicas misturadas em jantares, a dormir pouco ... como é que conseguirei subir ao Trevim?

No Sábado, à chegada, más notícias; o cepo da roda da bike de BTT não veio. A febre voltou a aumentar. Há um mês sem andar por terra, só andara na alcatrónica, fez com que começasse a ressacar do pó. Quer dizer, da poeirada que comemos pelos caminhos de terra, dos arranhões nos arbustos, dos sustos (daaasss ! ia caindo ...)  e outros privilégios só conhecidos pelos BTTistas. A febre baixou quando J. me emprestou uma roda. Tinha a bike com roda emprestada para Domingo.

28 Junho 2015
(Domingo)

O plano foi seguido no mais ínfimo detalhe.

Arranquei pela serra acima de tal modo desenfreado que, 2 Km depois, ia aflito do joelho esquerdo e do tendão de Aquiles direito. Então e o aquecimento pá?
Os 6 Km iniciais pela estrada Nacional serra acima servem para isso meso pá, para aquecer estúpido. Depois ter ter dado ouvidos à voz da consciência, ao Km 6, deixei a Nacional e cortei para a picada de S. Lourenço. Que delícia. Dia quente e nem uma brisa corria. O que corria muito bem era o suor.
Como andam a cortar madeira, o movimento dos tractores deixou o estradão coberto de um pó fino como a farinha. Tinha posto um protector solar detestável (daqueles eficazes mas que nos deixam completamente besuntados) e, portanto, fiquei imediatamente com um belo tom acastanhado. Homogéneo nas pernas, pescoço e braços e às manchas no nariz (é que o suor a escorrer e as assoadelas com as mãos levam à perda da homogeneidade no nariz).

E, às tantas, já ia aos 600 m de altitude, sobre o vale lá em baixo


e depois aos 700 m


Aos 800 m já se via o Buçaco e o Caramulo mas estava prestes a entrar num zona problemática.


Sobretudo em dias muito quentes e sem brisa.
O problema não é exclusivo desta serra. É, aliás, frequente no BTT, como todos os BTTistas sabem. Acontece em dias quentes, junto a arbustos e florestas fechadas e sobretudo em caminhos de forte inclinação.
O problema pode formular-se do seguinte modo:
à medida que o caminho fica mais íngreme a velocidade a que pedalamos tende a diminuir e, por outro lado, o suor tende a aumentar (escorre pela cara, vem para os olhos etc etc etc). Ora, o ponto crítico é quando a velocidade é inferior a 6-7 Km/h. É que a esta velocidade as moscas, mosquitos, varejeiras, moscardos e outros insectos CONSEGUEM ACOMPANHAR-NOS. E as moscas pousam na cara, e nos lábios, e nas orelhas, e o os mosquitos fazem uma nuvem à volta da cabeça e as forças para os enxotar já não são muitas, e se os enxotamos podemos perder o controlo da bike e é uma grande merda tudo isto.
PORTANTO, UMA REGRA BÁSICA DO BTT EM DIAS QUENTES E SEM VENTO É PEDALAR SEMPRE A UMA VELOCIDADE SUPERIOR AQUELA A QUE AS MOSCAS CONSEGUEM VOAR. De acordo com os meus cálculos - que são, aliás, baseados em várias observações reais no terreno -  é cerca de 7 Km/h.

A zona problemática é uma floresta belíssima, escura e fresca mesmo em dias de céu azul e quentes. Há por ali milhões de insectos, ouve-se um zumbido assustador, numa comunidade que compreende desde uns mosquitos que gostam de pousar na testa e no nariz até uns zangões enormes que parecem bombardeiros a voar à volta do capacete.
Combalido, devido à semana anterior em que basicamente o exercício físico que fiz foi entrar e sair do elevador entre o piso 0 e 12, a velocidade que ali levava naquele ponto da subida era claramente inferior à das moscas.


Com chegada aos 900 m, ao estradão das eólicas, a coisa melhora significativamente e os horizontes são deslumbrantes


mais exactamente aos 957 m. Tinha feito apenas 15.86 Km e já me elevara 813 m em altitude.


Este é um local que apela ao olhar.
Para a frente, vê-se ao longe o planalto da Serra da Estrela


e, para trás, o mar (na Figueira-da Foz) nos dias limpos.

A partir daqui, só (eh eh eh eh eh) faltam subir cerca de  300 m. Mas é um prazer imenso !
Há por ali uma bica escondida onde corre um fiozinho de água mas sempre constante, quer no Verão quer no Inverno. A água é tão fria que custa a beber no Verão. O risco é desmontar. Ali, a inclinação é superior a 18%. Parei, enchi o bidão, bebi, suspirei e, depois de algumas cenas tristes a tentar arrancar na subida, lá consegui montar na bike. O truque é não dar uma pedalada forte (porque faz resvalar a roda traseira na gravilha) mas dar um balanço com o corpo para a frente.

1172 m altitude. Os penedos de Góis e a aldeia de Povorais em primeiro plano


e o cone do Picoto da Cebola (a 1400 m altitude) na serra do Açôr a marcar a linha do horizonte. Quantas vezes estive já no Picoto da Cebola a olhar para aqui, para a Serra da Lousã.


E estava cumprido o plano. Chegada ao Trevim a 1200 m. A neblina ao longe não deixa ver o brilho do mar que é notório em dias limpos.


Pão com marmelada, água da bica e vamos embora que se faz tarde. Dos 1200 ao 200 em meia-hora por ali abaixo, por carreiros e estradões, com o ar quente a soprar ao ouvidos, numa descida controlada (digamos que ... a cerca de 75%) até casa.


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