Pedaladas citadinas em Tartu na Estónia.
É um privilégio inerente à actividade profissional que tenho; a organização das actividades onde vou participar fora do país costuma proporcionar visitas guiadas de autocarro às respectivas cidades. Eu prescindo e alugo uma bicicleta.
Aliás, este blog começou com um relato semelhante ao "Km 0" na Patagónia Chilena.
Percebemos que chegamos a um local civilizado quando na principal avenida da cidade, no cruzamento mais movimentado, encontramos esta sinalização:
ou quando nem frente ao edifício principal da Universidade há apenas estacionamento para bicicletas.
Em Tartu, ou Dorpat para os Alemães, estava localizada uma base militar Soviética e era, portanto, uma cidade "fechada". Durante a segunda guerra mundial foi intensamente bombardeada, tendo toda a zona central junto ao rio sido destruída. Como não havia recursos para a reconstrução, foram plantadas árvores e desenhados parques. Por isso, a zona central junto ao rio é hoje um local belo
para caminhar e pedalar, claro, como é bem visível nas placas.
Este foi um dos únicos edifícios da época Soviética que ficou em pé
É uma cidade pequena com uma praça central ladeada por edifícios clássicos e com a câmara municipal ao fundo, a marcar o início da praça. A fachada é pintada cor-de-rosa porque a imperatriz Russa da altura (provavelmente Catarina a grande) assim o impôs visto tratar-se da sua cor favorita. Afinal esta coisa do cor-de-rosa já vem de longe e deve estar nalgum gene feminino, inclusivamente nos genes de imperatrizes !
Em frente à câmara municipal, sobressai a famosa estátua do beijo. Reza a lenda que dois estudantes (male and female, by the way) beijavam-se apaixonadamente neste local (um quinto da população da cidade são estudantes universitários) durante uma tempestade. Ele, enquanto a abraçava eternamente com uma mão, com outra protegia-a da intempérie com um guarda-chuva. Não se sabe quanto tempo se beijaram mas, o que parece certo, é que durante o beijo ela (confirmaram-me que teria sido ela e não ele !) desejou que aquele momento se tornasse eterno. Os deuses do Olimpo devem ter ouvido o seu desejo pois, nesse momento, foram atingidos por um raio que os transformou em bronze. E, portanto, ainda hoje se beijam, mas num beijo mais metálico, bronze contra bronze.
Durante o Inverno, altura em que as temperaturas atingem 20 e até 30 graus Celsius negativos, a água da fonte que hoje os rodeia isola-os num invólucro gelado.
Na praça há o que eles chamam a "Torre de Pisa de Tartu". Os edifícios assentam sobre estacas de madeira uma vez que o rio no passado inundava esta zona. Em particular, este edifício afunda-se uns cm todos os ano porque as estacas de um dos lados estão podres. É um museu que podes ser visitado.
A par de Quioto no Japão, Tartu foi das cidades mais "bike-friendly" em que pedalei.
Mesmo na ruas mais apertadas, lá está o passeio para as bikes
Nas esplanadas (que são para os nativos, principalmente, e não para turistas porque .... não há turistas em magotes como noutros locais, há alguns turistas da região com ar descontraído) facilmente se encosta a bike ao chapéu de Sol junto à mesa e se pede uma salada com vários vegetais, atum, cereais e uma bela cerveja (tudo por 5 euros)
É uma estratégia fantástica para visitar uma cidade. É que além de se fazerem praças, ruas e avenidas rapidamente, sem grande esforço e livremente sem constrangimentos de transportes, descobrem-se pequenos recantos como, por exemplo, este em que Oscar Wilde conversa com um cavalheiro de Tartu (sob o ouvido atento de um outro cavalheiro de chapéu e bicicleta !)
ou este. Uma das últimas caixas de correio que ainda existem do tempo da Uniâo Soviética
Nos arredores da zona central estendem-se as zonas habitacionais constituídas por casas de madeira e quintais, umas mais luxuosas (a minha bike na fotografia)
do que outras
Na Igreja de "S. João" 4 violoncelistas davam um concerto, tocando ... Bach, Queen (!!), Tina Turner (!!!) e (vá lá, ao menos isto) Stairway to Heaven dos Led Zeppelin.
Na esquina seguinte, um fresco pintado na fachada de um edifício retratando a Universidade no séc XIX
Mais umas pedaladas e, de novo na zona central, uma loja para provar vinho. Na montra, decorada com um amontoado de rolhas de cortiça, estava gentilmente disponibilizado de borla um conselho para vida :
wine is an invitation to go on a journey.
Gostei deste país pelas pessoas interessantes, pela ausência de "show-off", pela vida activa que parecem ter, pela extraordinária facilidade no acesso à net ... Já na capital da Estónia, em Tallinn, o aeroporto é extremamente confortável, com comida boa e (para nós) barata e à medida deste país de 1,5 milhões de habitantes.
Mas que belo passeio, João.
ResponderEliminarTal como a tal de Catarina, gosto do pink, mas conheço algumas ladies que preferem o red.
Beijo bronze contra bronze:
- Claro que foi ela a culpada; os eles nunca têm culpa de nada, pois não?
- Beijo eterno granito contra granito, pode ser visto à entrada da Sortelha (do lado esquerdo), mas não caíu por lá nenhum raio, são apenas duas pedras a fazer um biquinho (está na net).
E a conversa do Wilde era interessante?
Maria
Já fui à net ver o "beijo eterno" de pedra e Sortelha. Provavelmente ainda mais eterno que o de bronze de Tartu. Gostava de os ter visto no Inverno, sob um manto de gelo. Bem vistas as coisas foi ela que os tornou eternos.
EliminarO Wilde e o o cavalheiro eram de poucas palavras. Estando perto do beijo eterno, fiquei com a impressão que falam do efémero, da natureza fugaz da nossa existência ...
Extraordinário, Maria, foi ter dado com os 4 violoncelistas na Igreja (puro acaso) a tocar Led Zeppelin (além dos outros que mencionei, incluindo J. S. Bach).
João